A arquitetura vernacular é uma tipologia particular de determinadas localidades, a qual utiliza dos materiais e recursos disponíveis para a sua concepção. Porém, esses fatores não são suficientes para determinar essa arquitetura tão rica e que também envolve conceitos de tradição, cultura e expressão. A arquitetura vernacular brasileira, assim como em outros locais, é estigmatizada como “primitiva” e “inferior” em relação a outros modelos arquitetônicos como a arquitetura gótica ou moderna, por exemplo.
Essa visão negativa passou a ser repensada no início do século XX, quando essas tipologias foram revisitadas e se tornaram modelos de referência para a arquitetura sustentável contemporânea. Ainda que tenha recebido certa credibilidade em relação aos princípios bioclimáticos, a arquitetura vernacular ainda é vista como uma estética inferior e suas referências são constantemente ignoradas pelos arquitetos contemporâneos.
Nesse artigo, vamos esclarecer o que é a arquitetura vernacular, quais são suas características e como ela é importante na afirmação cultural do seu povo. Também vamos apresentar projetos que resgatam essas raízes para te inspirar a utilizar essas técnicas e saberes nos seus projetos, contribuindo para o fortalecimento cultural do Brasil. Acompanhe através dos seguintes tópicos:
Aproveite a leitura!
O que é arquitetura vernacular?
A definição da arquitetura vernacular ainda é um tema em debate, o qual traz termos como “arquitetura popular” e “arquitetura primitiva” para a discussão. É difícil definir a linha que separa esses conceitos e diversas vezes ocorre sobreposição dessas arquiteturas. Apesar disso, existe um certo consenso sobre algumas características vernaculares. Paul Oliver, em seu livro Built to meet needs: cultural issues in vernacular architecture (2006), define a arquitetura vernacular como:
Arquitetura que compreende as habitações e outras construções dos povos, relacionadas aos seus contextos ambientais e recursos disponíveis, costumeiramente construídas por seu proprietário ou pela comunidade, utilizando tecnologias tradicionais. São formas construídas para atender as necessidades específicas, acomodar valores, economias e modos de vida das culturas que as produzem.
Além dos aspectos citados por Paul Oliver, vamos entender outras características que são atribuídas à arquitetura vernacular.
O primeiro aspecto diz respeito à tradição, a qual configura o uso de precedentes conhecidos para a concepção da arquitetura. Nesse conceito, o construtor utiliza de técnicas e materiais consagrados ou parcialmente modificados. Esses saberes tradicionais são passados de geração para geração.
Porém, ao analisar a arquitetura de hoje, é possível reconhecer a tradição em sua prática. Os arquitetos contemporâneos também se utilizam de referências passadas para elaborar um novo projeto. As necessidades humanas de abrigo contra intempéries, autopreservação e até mesmo conforto estão presentes na prática arquitetônica há milhares de anos, e as suas soluções evoluíram muito lentamente.
Somente muito recentemente, com o avanço tecnológico, que a arquitetura foi capaz de quebrar paradigmas e conceber construções totalmente inovadoras. Porém, essas expressões são obras excepcionais e, portanto, não são demonstrativas do acervo arquitetônico atual. As obras convencionais são comumente embasadas em referências anteriores, nesse sentido, entende-se a visão do arquiteto Hassan Fathy quando diz que:
“A arquitetura ainda é uma das artes mais tradicionais”.
Logo, a tradição por si só não é capaz de definir a arquitetura como vernacular.
A segunda característica é referente ao contexto. Rapidamente associado ao termo “arquitetura vernacular”, esse aspecto diz respeito ao uso de materiais e recursos do próprio ambiente onde a construção está implantada. Existe o entendimento e respeito às condições geográficas e, por isso, essa arquitetura não possui um estilo, sendo bastante plural e variável de acordo com as localidades.
Essa arquitetura será essencialmente o resultado do que oferece o meio físico e geográfico local. Não é exagero afirmar, portanto, que a arquitetura vernacular é uma ‘amostra’, em termos de abrigo, dos recursos naturais existentes em uma determinada região, sejam eles a pedra, o barro, a madeira, o gelo (no caso de países nórdicos), a palha, etc.
Devido a sensibilidade ao meio que está inserida, a arquitetura vernacular passou a ser foco de estudo para a arquitetura sustentável e bioclimática. Práticas arquitetônicas milenares estão sendo revisitadas e reproduzidas com o objetivo de conceber construções mais “verdes”, assimilando estratégias passivas de conforto, para redução do gasto de energia, e técnicas de construção limpas, que reduzem a emissão de gás carbônico no meio ambiente. É importante lembrar que a arquitetura vernacular não é uma resposta imediata do clima, porém, uma das principais condicionantes de sua concepção.
A terceira característica é a ausência do arquiteto. Apesar de alguns autores mencionarem o projetista quando citam a arquitetura vernacular, o entendimento atual considera essa arquitetura como anônima e livre dos aspectos técnicos que configuram um projeto. Segundo a definição do arquiteto Elvan Silva:
O abrigo‚ produzido pelo próprio usuário, geralmente reproduzindo um estereótipo ou modelo concreto, sugerido ou imposto pela tradição. Não existe a figura do construtor profissional, nem o conceito abstrato de arquitetura como forma de conhecimento; neste contexto, o projeto é totalmente dispensável e inconcebível.
A quarta característica diz respeito à identidade cultural. A concepção da habitação, sua forma e organização, está diretamente conectada aos valores socioculturais ao qual ela pertence. A casa responde aos propósitos e necessidade de um determinado povo, tanto que, mesmo em arquiteturas contemporâneas, é possível identificar distintas localidades ao se observar as habitações.
É claro que a globalização, bem como os estilos arquitetônicos, tendem a influenciar e modificar as concepções espaciais, principalmente em centros urbanos, porém em residências mais afastadas, ou até mesmo na arquitetura de interiores, é possível observar traços de identidade cultural.
A arquitetura vernacular tem esse traço muito forte, pois a construção da própria casa, com os materiais e recursos nativos, configuram um visual muito específico e livre de influência de estilos, além de fortalecer o vínculo do povo com o ambiente habitado, enriquecendo o sentimento de pertencimento.
O quinto aspecto a ser abordado é relativo às variações dentro da arquitetura vernacular. Essa arquitetura tende a ser repetitiva, o que é objeto de crítica. Porém, ao analisarmos o tradicionalismo da arquitetura atual, é visível que ela também se repete. O próprio processo criativo na arquitetura trata a criatividade como um novo olhar sobre referências existentes, dentro de novas condicionantes.
Apesar do aspecto repetitivo, a arquitetura vernacular admite variações, porém elas são totalmente diferentes do que se busca na concepção de um projeto contemporâneo. Enquanto os novos projetos procuram criar algo novo, como uma nova “palavra” dentro da linguagem existente (a qual posteriormente é integrada ao “vocabulário”), o vernáculo tende a seguir o repertório oferecido pela linguagem vigente, e suas modificações não se configuram ao nível de “nova palavra”. O arquiteto João Rodolfo Stroeter explica:
Entendida como língua, a arquitetura formada ao longo do tempo e da história, é a somatória do trabalho de muitos, fenômeno coletivo e social a arquitetura da língua é um repertório que oferece combinações particulares possíveis. A arquitetura como palavra resulta de um ato individual, geralmente de inconformismo e rebeldia. O edifício surge como uma ação isolada do arquiteto. É um fenômeno novo, uma obra individual, pessoal e consciente. É um trabalho de exceção, que desobedece as regras.
Em relação aos estilos arquitetônicos, eles não se aplicam à arquitetura vernacular, pois, como vimos anteriormente, ela segue “regras” bem específicas à sua cultura e localização, resultando em um acervo bastante plural. Dessa forma, o vernáculo dificilmente se encaixa em um centro urbano, o qual trabalha com esses estilos e tendências. Ele será visualizado principalmente em áreas rurais. Áreas periféricas tendem a gerar um híbrido dessas arquiteturas, conservando valores vernáculos e adaptando-os às tendências e técnicas contemporâneas.
Com essa abordagem sobre as características vernáculas, podemos adotar a definição do Vitruvius para definir a arquitetura vernacular por completo:
Uma arquitetura tradicional, resultante do desenvolvimento histórico de um determinado povo. Ela prescinde tanto do arquiteto como do projeto, na sua concepção contemporânea. Não cabe nas classificações estilísticas da arquitetura convencional. Origina-se ou é mais frequente em área rural. Respeita e se adapta bem às diversas limitações tecnológicas e físico-ambientais. A tecnologia é autóctone, primitiva, rudimentar, quando comparada à tecnologia formal. Ela permite variações ao nível da língua, mas não da palavra. A arquitetura vernacular é fundamentalmente a expressão de um povo, e, portanto, um ato cultural.
A história da arquitetura vernacular
A história da arquitetura vernacular começa há nove mil anos atrás, com o período neolítico, onde o ser humano deixa o estilo de vida nômade e passa a ser sedentário. Essa revolução só foi possível devido aos avanços na agricultura, que permitiram o assentamento dos povoados em locais fixos. Assim se iniciam as concepções das primeiras moradias permanentes e cidades primitivas. A partir desse ponto, começam a se desenvolver a economia, política e todas as disciplinas referentes à sociedade.
Além das cavernas, no período Neolítico os povos viviam em choupanas, feitas de galhos e folhas. Com o tempo, surgiram as construções de pedra, mais resistentes e ideais para famílias sedentárias. A arquitetura vernacular abarca a maioria das residências no mundo. As pessoas constroem as suas casas e ensinam os seus filhos e netos, que erguem outras residências no mesmo terreno.
É intuitivo imaginar que essas primeiras arquiteturas seriam executadas com os materiais e recursos disponíveis no local, até porque não havia outra forma de se conceber as moradias. Também é evidente que os conhecimentos são passados de geração em geração, pois as instituições de ensino ainda estão longe de serem desenvolvidas.
Essa arquitetura também é chamada de “primitiva” e, como comentado inicialmente, existe um debate sobre sua distinção com a arquitetura vernacular. Porém, nesse artigo abordaremos a visão que permite a sobreposição de ambas.
A seguir vamos entender a história da arquitetura vernacular brasileira e quais são os principais modelos vernáculos do Brasil.
Arquitetura vernacular Brasileira
A arquitetura vernacular brasileira tem início com os povos indígenas, no período pré-colonização. Devido a amplitude do território brasileiro, as variantes climáticas são muito distintas. Além disso, a diversidade das tribos resulta em costumes e culturas bastante plurais, de forma que os modelos de arquitetura vernacular indígena não são uniformes.
É somente em 1530, com a chegada dos portugueses no Brasil, que a arquitetura colonial é inserida no repertório da arquitetura brasileira. O estilo colonial precisou ser adaptado, pois o Brasil não contava com os mesmos materiais e recursos da Europa. Essas adaptações envolveram os conhecimentos e culturas das mão de obra indígenas e africanas, destacando técnicas como taipa de pilão e pau a pique. Também é possível observar a influência alemã nas construções ao Sul do país.
A arquitetura vernacular brasileira, assim como em outras localidades, se manifesta principalmente nas habitações. Ela nasce da necessidade de conceber uma moradia para um determinado povo, de acordo com seus recursos, técnicas e costumes. Vamos conhecer algumas das principais arquiteturas vernaculares brasileiras.
- Oca: tipologia indígena que configura uma unidade habitacional formadora das aldeias. Essas habitações são geralmente executadas em madeiras com entalhes para encaixes ou amarradas com cipós e cobertura vegetal. Não possuem divisões internas e são espaços onde se desenvolvem tarefas cotidianas como produção de objetos e alimentos. A palavra Oca é do Tupi e também pode ser denominada Oga em Guarani.
- Maloca: também é uma tipologia de arquitetura vernacular indígena, porém abriga vários grupos familiares. A maloca possui divisões internas em espaços de aproximadamente 6x6m e a construção inteira pode chegar a 200 metros de comprimento. “Maloca” significa “casa grande” e possui materiais construtivos semelhantes aos da oca.
- Quilombos: espaços de habitação da resistência de escravos africanos e afrodescendentes. Sua técnica emprega o pau a pique nas estruturas e a cobertura pode ser tanto vegetal quanto em telha de barro.
- Pau a Pique: Também denominado taipa de mão ou taipa de sopapo, essa técnica tem origem africana e consiste em executar uma estrutura em trama de madeira ou bambu, amarrando as peças com cipós, a qual é fixada ao chão. Os espaços vazios da trama são preenchidos manualmente com barro. A cobertura pode ser vegetal ou em telha de barro.
- Taipa de Pilão: A técnica é semelhante ao pau a pique, porém nesse caso as tramas funcionam como fôrmas. A terra, juntamente com o cascalho e cal, são compactados com pilões de madeira. Após o assentamento, a trama é removida. A cobertura tem pode ser vegetal ou em telha de barro.
- Palafita: habitações executadas sobre estacas, como resposta ao contexto alagadiço. Essa tipologia é encontrada principalmente na região norte, onde os índices pluviométricos são elevados. As casas são elevadas do solo, permitindo que as enchentes passem “por baixo” das estruturas, sem afetar as habitações.
- Enxaimel: arquitetura inserida por influência alemã no Sul do país. Consiste na construção de uma treliça de madeira, encaixando peças verticais, horizontais e diagonais, sem a utilização de pregos. Os vazios são preenchidos com tijolos, pedras ou terra.
- Barracos: tipologia vernacular mais “recente” dentre as citadas, os barracos são a unidade habitacional formadora das favelas no mundo inteiro. No Brasil essa tipologia é caracterizada pelo uso de alvenaria sem reboco.
A arquitetura vernacular por muito tempo foi interpretada como de baixa qualidade e inferior aos estilos arquitetônicos eruditos, e de certa forma até hoje existe um certo estigma quanto a este modelo de construção. Foi somente na segunda metade do século XX que essas arquiteturas receberam outros olhares, com as interpretações de Le Corbusier e Frank Lloyd Wright. No Brasil quem toma a frente no renascimento da arquitetura vernacular brasileira é o arquiteto Lúcio Costa, em 1930, com o movimento de identidade nacional.
A questão entra em pauta novamente em 1960, devido a crise do movimento moderno e a necessidade de valorização dos aspectos culturais e arquitetônicos, dessa vez com Lina Bo Bardi contribuindo para a discussão. No ano de 1992 a agenda 21 já destacava a capacidade destrutiva da indústria de construção e recomendou a utilização de técnicas populares para reverter esse cenário.
Esses são apenas alguns exemplos de como a arquitetura vernacular sempre retomou a sua posição de foco ao longo da história até chegar aos dias atuais, onde ela se solidifica como forte aliada da arquitetura sustentável, apontando princípios bioclimáticos para as concepções contemporâneas. Ela também é uma ferramenta de resgate e conexão às raízes culturais do Brasil, além de ser um acervo riquíssimo de referências e saberes para os profissionais de arquitetura.
Características da arquitetura vernacular
As características de uma arquitetura vernacular podem variar muito, pois como vimos, essa arquitetura é muito plural e seus aspectos são moldados a partir da sua localidade e comunidade. Analisar cada uma dessas variações seria um trabalho muito complexo, porém a arquitetura sustentável reuniu alguns dos principais aspectos de cada localidade para aplicá-los nos princípios bioclimáticos das construções.
O foco deste artigo é a arquitetura vernacular como um todo, ou seja, abriga todos os diversos modelos concebidos nessa tipologia, com destaque para a arquitetura brasileira. Portanto, vamos caracterizar essa arquitetura em seus aspectos globais, que dizem respeito a todos os modelos vernáculos, independente da cultura ou localidade que está inserido.
- Tradição: a construção é concebida com conhecimentos transmitidos tradicionalmente de geração para geração.
- Contexto: as construções são intimamente ligadas aos condicionantes geográficos e utilizam recursos e materiais locais. O resultado é uma arquitetura adaptada ao clima, com conforto ambiental, uso de materiais orgânicos e técnicas ambientalmente amigáveis. Considerada um exemplo de arquitetura sustentável, é uma forte inspiração para as arquiteturas bioclimáticas contemporâneas.
- Identidade cultural: a arquitetura vernacular é fortemente ligada aos aspectos socioculturais da comunidade em que está inserida. Ela responde a costumes e práticas específicas, possui o visual característico do ambiente e fortalece o sentimento de pertencimento ao local. Sua própria concepção configura um ato de expressão cultural.
- Adequação: a arquitetura vernacular preza pela funcionalidade, ela deve se adequar ao clima e também as necessidades e propósitos do povo que serve. No geral costuma ser uma arquitetura minimalista, no sentido de não conter excessos. Ela é pensada e dimensionada para as necessidades, bem como para os recursos e mão de obra disponíveis para sua construção.
- Ausência do arquiteto: é uma arquitetura produzida pela comunidade e para a comunidade. Seu objetivo é atender as necessidades do grupo, de forma que a arquitetura é interpretada como um coletivo e não obra independente de um determinado arquiteto. Nesse contexto não cabe a figura profissional nem mesmo o exercício técnico do projeto arquitetônico.
- Variações: a arquitetura vernacular não segue estilos arquitetônicos, nesse sentido ela é única, mas ao mesmo tempo ela também é diversa, pois cada localidade vai desenvolver o seu próprio “estilo” dependendo das variantes locais e costumes. As variações do “estilo” adotado por determinada comunidade são sutis e seguem a linguagem dos ensinamentos anteriores, não existe a ambição de criar algo novo, pelo menos não de forma consciente.
Exemplos de arquiteturas contemporâneas inspiradas na arquitetura vernacular brasileira
Todo arquiteto que menospreza a arquitetura vernacular ainda não entendeu o seu verdadeiro significado e potencial. Os diversos modelos vernáculos são ricos em saberes e configuram excelentes referências para o desenvolvimento de uma arquitetura brasileira forte, que resgata e enaltece as raízes culturais do Brasil, evidenciando a identidade cultural e o sentimento de pertencimento nacional.
Além disso, a arquitetura vernacular contribui para o desenvolvimento da arquitetura sustentável. Através de diretrizes bioclimáticas, categorização de materiais disponíveis, técnicas ambientalmente amigáveis, dentre outros. Os modelos vernáculos certamente são facilmente apresentados como inspiração para arquiteturas de alto desempenho. O Brasil possui um vasto acervo que se adapta aos diversos microclimas e inspira obras muito interessantes e eficientes.
Além disso, os saberes nativos também podem guiar desde projetos de pequena escala, como arquitetura de interiores - pois, como visto, dificilmente uma arquitetura vernacular terá espaço em um centro urbano, porém ela pode se manifestar nos espaços internos e inclusive contribuir para a neuroarquitetura - até espaços de grande escala, como projetos de arquitetura e urbanismo, pois as próprias organizações das vilas e aldeias podem nos ensinar sobre o comportamento social no espaço físico.
Se você ainda tem uma visão estigmatizada e negativa sobre a arquitetura vernacular brasileira, continue lendo, pois você está prestes a modificar totalmente o seu olhar sobre essas referências. Separamos cinco projetos que resgatam as origens nacionais e reforçam a identidade nacional com muita elegância.
01 - Instituto Socioambiental ISA | Brasil Arquitetura
Localizada na cidade de São Gabriel da Cachoeira, a 1.000km a noroeste de Manaus e as margens dos Rio Negro, o Instituto ISA contou com mão de obra índigena para a concepção da cobertura em palha piaçava, madeira e cipós, a qual garante o conforto térmico, proporciona um amplo espaço de convivência e faz referência às malocas.
A estrutura principal conta com pilares de tronco e as esquadrias, escadas e outros elementos também fazem o uso da madeira. Observe o detalhe do guarda corpo da escada amarrado com cipós, as redes e o forro em tapeçarias que trazem uma ambientação muito característica da cultura indígena e brasileira. Todo o edifício é aberto e permite a ventilação, apreciação da paisagem e interação social. Confira os detalhes!
02 - Brasil de Pau a Pique | Roberto Migotto (Casa Cor SP 2015)
O Brasil de Pau a Pique de Migotto traz a técnica vernacular de forma literal e muito elegante. Os tons terrosos são utilizados harmoniosamente. Na cozinha observa-se a marcenaria e móveis em tons mais claros e neutros, que conversam muito bem com as paredes de pau a pique. A cor é inserida em alguns detalhes e plantas que também respeitam o contexto visual. A mesa e as cadeiras são executadas em madeira.
Já nas salas, os tons terrosos aparecem mais vibrantes, com destaque para os tapetes com motivos da fauna e flora brasileiras, poltronas e banquinhos em tons laranja. A mobília também utiliza madeira, e a decoração conta com plantas e quadros vibrantes que traduzem a tropicalidade no ambiente. Para a divisão da sala de jantar com a sala de estar principal, foi utilizado um painel de madeira em trama que faz referências às árvores.
03 - Casa em Cunha | Arquipélago Arquitetos
Localizada no Sertão de Cunha, interior de São Paulo, a Casa Cunha toma partido em sua implantação, fazendo um corte no terreno e encaixando a residência em um semi enterrado que abriga a casa dos ventos frios, utilizando dos princípios bioclimáticos de conforto. A terra retirada no corte foi o material utilizado para a execução das paredes, as quais são executadas na técnica de taipa de pilão. Todas as características como dureza, cor, brilho, tatilidade e inércia térmica são decorrentes das características físicas e químicas do solo local.
As demais paredes são executadas em tijolos cor de palha, fabricados por uma olaria local. Parte do mobiliário fixo, como lareira e estante, também é executado em taipa de pilão. A madeira também é um elemento fortemente presente, encontra-se nas esquadrias, no forro, no piso e em outros elementos. A decoração é simples e em tons neutros, exceto pelo sofá da sala que se destaca em azul. Por vezes o próprio encanamento também é abordado como elemento estético, confira os detalhes!
04 - Casa AA | Argus Caruso - Arquitetura e Construção
Localizada na praia de Itamambuca, litoral norte de São Paulo, o projeto utiliza princípios bioclimáticos para garantir o conforto e aplica diversos materiais naturais, como bambu, terra, fibras e madeira. Todo material adquirido para a obra foi utilizado e não gerou resíduos. As paredes foram executadas em terra, em geral na técnica de pau a pique, exceto uma parede estrutural que contou com a técnica de taipa de pilão.
A madeira também está fortemente presente, aparecendo no deck, nas esquadrias e na cobertura, a qual utiliza troncos para a estrutura.Os tons quentes das paredes em terra conversam bem com a ambientação terrosa e mobiliários característicos que trazem bastante brasilidade para o ambiente em diversos tons de madeiras. As paredes baixas protegidas por uma única cobertura, bem como o piso batido reforçam os aspectos da arquitetura vernacular brasileira. Confira os detalhes!
05 - Barraco | Q&A
Uma referência de brasilidade no exterior, o Bar Brasileiro Barraco se localiza em Xangai, na China. A ambientação conta com materiais reciclados, como portas e janelas de edifícios demolidos para recriar a atmosfera colorida, desordenada e informal das cidades tropicais.
As paredes recebem acabamento em concreto aparente, enquanto o piso, além do concreto, também conta com madeira e pedrinhas brancas. Esses tons neutros são a base para o caos organizado dos forros que trazem bastante cor e elementos em madeira com inclinações irregulares. Nesse forro se penduram as plantas e os balanços, como se o caos gerasse esses elementos pontuais que descem até o nível do espectador. Uma mesa/porta amarela pode ser içada e abrir espaço para festas e eventos maiores.
O forro que faz referência aos barracos é o destaque. A ambientação conta ainda com muitas plantas que trazem a tropicalidade, além do mobiliário de balanços e banquetas em madeira. O Bar Barraco traz elementos brasileiros como cadeiras de praia e elementos de decoração como bonecos de barro, chapéu de cangaço, moedor, tucanos e até chimarrão. Confira os detalhes!
A arquitetura vernacular brasileira é uma eterna fonte de referências para projetos sustentáveis, adequados ao clima, materiais e recursos disponíveis e abundantes. Além disso, é uma ferramenta poderosa para o resgate das raízes brasileiras e afirmação da identidade nacional. É papel do arquiteto brasileiro conhecer, respeitar e reverenciar essas raízes, enaltecendo os saberes e visuais nacionais que tantas vezes são discriminados e estigmatizados como inferiores às técnicas e culturas estrangeiras.
Até a próxima,
Equipe Vobi
Referências:
www.archdaily.com.br
www.vitruvius.com.br
www.archtrends.com
www.entendaantes.com.br
www.laart.art.br
www.robertomigotto.com.br
www.denainteriores.blogspot.com
www.vivadecora.com.br
www.imed.edu.br